“Justiça tributária, embora impregnada de apelo social, se faz quando todos contribuem, sem nenhum devaneio governamental por receita”
O Ministério da Fazenda analisa a criação de um imposto mínimo para pessoas físicas com renda anual superior a R$ 1 milhão. A medida, que prevê alíquotas entre 12% e 15%, tem como objetivo garantir uma tributação mais justa sobre grandes rendimentos, incluindo lucros, dividendos e ganhos financeiros. A proposta também prevê o ajuste no Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), cobrando a diferença se o valor pago for inferior ao estipulado
Ranieri Genari, advogado especialista em Direito Tributário e consultor da Evoinc, aponta que a criação desse imposto seria uma contrapartida para o ajuste da tabela progressiva do IRPF, isentando rendas de até R$ 5.000, que foi promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). No entanto, ele destaca que o sucesso da medida é incerto, “visto que propostas semelhantes, como a do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF), previsto no art. 153 da Constituição de 88, cujo lobby no Congresso dificilmente permite avançar”, afirma Genari.
O advogado considera essa discussão inócua porque deixa de lado o cerne da questão do sistema tributário brasileiro: sua regressividade. Ele explica que o atual modelo do IRPF penaliza desproporcionalmente os contribuintes de menor renda, aplicando alíquotas efetivas muito próximas para pessoas com rendas médias e altas. “Alguém que ganha R$ 100 mil por ano paga 26,46% de imposto, enquanto uma pessoa com renda de R$ 1 milhão é tributada em 27,39%. Isso demonstra uma falha no princípio da capacidade contributiva”, ressalta Genari.
A proposta, além de gerar questionamentos internos, enfrenta desafios internacionais. Genari aponta que vários países que adotaram impostos semelhantes desistiram da ideia, como França, Alemanha e Suécia, devido à fuga de capitais. “Na França, o imposto sobre grandes fortunas foi extinto em 2018 porque os contribuintes ricos transferiram seus patrimônios para outros países com menor tributação ou ainda para a um paraíso fiscal. No cenário atual, somente alguns países, como Espanha e Noruega, ainda mantêm esse tipo de tributação, mas com resultados limitados”, explica.
Para o tributarista, o Brasil deve seguir um caminho diferente, apostando em uma reforma ampla do IRPF. “Ao preferir políticas que possam provocar evasão fiscal, o governo deveria focar na criação de novas faixas de tributação e isenções, garantindo uma verdadeira progressividade, beneficiando os contribuintes de baixa renda, que são os mais prejudicados pelo sistema atual”.
“É importante ressaltar que justiça tributária, embora impregnada de apelo social, não se faz com políticas ‘Robin Hood’, tirando de ricos para dar aos pobres, mas sim quando todos contribuem, cada um na medida de sua capacidade, sem nenhum devaneio governamental por receita”, conclui Genari.
Fonte: Ranieri Genari, advogado especialista em Direito Tributário pelo IBET, membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/Ribeirão Preto, consultor tributário na Evoinc.