A suspeita sessão da emenda

Notas taquigráficas apreendidas por investigadores mostram como os distritais se comportaram durante a reunião que definiu a liberação do aditivo para pagamento de dívidas do governo com UTIs e que teria sido negociada em troca de propinas

POR HELENA MADER – CORREIO BRAZILIENSE –

 

Na segunda etapa da Operação Drácon, realizada na última sexta-feira, os investigadores apreenderam notas taquigráficas e o áudio da sessão da Câmara Legislativa realizada em 8 de dezembro de 2015. Na data, os deputados distritais aprovaram o Projeto de Lei nº 811/2015, com a apresentação da emenda que teria sido supostamente negociada com empresários em troca de propina. O Correio teve acesso às declarações dos parlamentares durante essa sessão. O documento está nas mãos de promotores do Ministério Público e de policiais da Delegacia de Repressão aos Crimes contra a Administração Pública e deve ser usado como prova nas investigações.

 

O PL 811/2015, de autoria do Poder Executivo, foi protocolado na Câmara em 7 de dezembro de 2015. O texto previa a abertura de crédito suplementar ao orçamento no valor de R$ 18 milhões, para o pagamento de atividades de limpeza urbana. Era considerado importante para garantir o salário de funcionários do Serviço de Limpeza Urbana. No dia seguinte, o projeto foi lido em plenário e aprovado em dois turnos.

 

O projeto não estava na pauta e a inclusão do PL na lista de propostas a serem votadas naquela sessão veio do deputado distrital Júlio César (PRB). Na época, ele era líder do governo. O parlamentar é um dos investigados no esquema, assim como a presidente afastada da Casa, Celina Leão (PPS), e os distritais Bispo Renato (PR), Raimundo Ribeiro (PPS) e Cristiano Araújo (PSD).

 

A votação do texto ocorreu com a presença de funcionários do SLU, que acompanharam a sessão para pressionar os deputados pela aprovação do texto. O projeto de lei recebeu a apresentação de oito emendas durante a sessão. Uma delas, a emenda aditiva 8, é o principal alvo da Operação Drácon. Com esse dispositivo incluído na proposta, os distritais realocaram R$ 31 milhões de sobras orçamentárias da Câmara para o pagamento de dívidas com empresas de UTI.

 

O deputado Agaciel Maia (PR), presidente da Comissão de Economia, Orçamento e Finanças, pediu aos colegas que não apresentassem emendas para agilizar a redação final do projeto do SLU. “Gostaria de contar com a compreensão dos nobres deputados no que diz respeito à apresentação de emendas a este projeto do SLU. Então, eu pediria a compreensão dos parlamentares para que deixassem para apresentar as emendas em outro crédito que temos aí. Ao apresentar emendas a esse projeto, vamos (…) atrasar o encaminhamento à sanção do governador”, justificou Agaciel.

 

O deputado Cristiano Araújo não gostou do entendimento do colega. “Respeito a posição do relator, mas são detalhes. A gente vai dispensar a redação final, não vai atrasar a votação. É para acomodar os interesses políticos”, argumentou Cristiano, em defesa da inclusão de emendas. Diante da controvérsia, a então presidente da Casa, Celina Leão, optou por votar o texto em primeiro turno sem emendas e deixou para incluir os apêndices no segundo turno. O deputado Wasny de Roure (PT) reclamou do fato de a proposta não ter tramitado nas comissões. “Ajudaria muito que o governo encaminhasse os próximos com certa antecedência.”

 

Presidente

 

No momento da votação do PL 811/2015 em primeiro turno, quem presidia a sessão era a então vice-presidente, Liliane Roriz (PTB). A parlamentar denunciou o episódio da suposta cobrança de propina pela inclusão da emenda e, em 8 de dezembro, já tinha conhecimento de possíveis irregularidades na inclusão. “Os deputados que aprovam o projeto permaneçam como estão. Os que forem contrários queiram manifestar-se”, disse Liliane. “O projeto está aprovado com a presença de 22 deputados”, declarou a parlamentar naquela sessão.

 

No mesmo dia, às 19h15, foi aberta uma sessão extraordinária, durante a qual o PL foi votado em segundo turno. Os distritais apresentaram oito emendas, entre elas, a que destinou R$ 31 milhões para o pagamento de dívidas de UTIs. Em nenhum momento da votação, a finalidade da emenda foi detalhada. A única explicação dada na sessão foi a de que a medida cancelava recursos da Câmara Legislativa e suplementava “rubricas da mesma instituição”. O parecer veio pelo acolhimento de todas as emendas e o texto teve a aprovação dos 18 deputados presentes no segundo turno.

 

Para saber mais

 

Arquivos apagados

 

A segunda fase da Operação Drácon, realizada na última sexta-feira, foi autorizada pelo relator do processo no Tribunal de Justiça, desembargador José Divino. Os agentes da Delegacia de Repressão aos Crimes contra a Administração Pública e os promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público cumpriram mandatos de busca e apreensão em vários gabinetes da Câmara Legislativa. Eles apuram o sumiço de provas e tentativas de ocultar crimes. Ao menos 54,2 mil arquivos foram apagados de computadores da Casa.

 

Governo articula verba para o setor

 

A carestia nos cofres da Secretaria de Saúde chega a R$ 600 milhões. Em tempos de crise na saúde e da Operação Drácon, o Executivo articula aportes com a Câmara Legislativa para atenuar o deficit. Na semana passada, os distritais destinaram emendas para o Fundo de Contingência do GDF. Para a saúde, o complemento atinge R$ 98 milhões. A receita será aplicada em três áreas sensíveis: aquisição de medicamentos, pagamento de empresas terceirizadas e manutenção de equipamentos. O recurso faz parte de 146 emendas aprovadas pelos deputados no último dia 30, como parte do Projeto de Lei nº 1.193/2016, de autoria do Palácio do Buriti.

 

 

O foco do Executivo é garantir a continuidade de serviços básicos. Estão em falta 93 dos 850 medicamentos fornecidos pelo governo — 11% do total. O valor para o abastecimento total é de cerca de R$ 270 milhões. Para a realização total dos equipamentos, que hoje possui 21% de cobertura contratual, o governo necessita de cerca R$ 80 milhões por ano. A Secretaria de Saúde não soube precisar a dívida atual com empresas terceirizadas de serviços como limpeza, alimentação e segurança.

 

 

O diretor do Fundo de Saúde do DF, Arthur Luis Pinho de Lima, diz que o recurso, apesar de insuficiente para cobrir os gastos, diminui o deficit da pasta. “Qualquer recurso vai facilitar o fechamento do ano”, comemora. O Executivo tem até 15 dias para analisar tecnicamente o projeto e sancionar a matéria. Durante esse período, a Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão verifica “se a proposta está em conformidade com o Plano Plurianual (PPA) de 2016 a 2019 e com a legislação vigente”.

 

 

A realocação será feita por meio de decreto de orçamento suplementar de áreas específicas, ou seja, o Executivo é quem decide onde o dinheiro será aplicado, diferentemente do que ocorreu com as sobras orçamentárias de 2015, usadas no pagamento de dívidas do GDF com empresas de UTIs — o que desencadeou a Operação Drácon, que apura suposta cobrança de propina após as denúncias da deputada Liliane Roriz (PTB). Interlocutores do Palácio do Buriti tentam convencer os distritais a destinarem mais dinheiro para o Fundo de Contingência. Entretanto, os parlamentares estão arredios devido à instabilidade política agravada pelo escândalo UTIgate. (OA)

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