[artigo] O GRITO DO SILÊNCIO NA ESCOLA PÚBLICA DO DF

Por: Cristino Cesário Rocha*

O acontecimento, muito mais do que um simples fato (estudante que provoca transtorno em sala de aula – CEF 306 -Recanto das Emas-DF), colocado em discussão por diferentes agentes institucionais e educativos coloca em evidência a função social do Estado, as contribuições da sociedade civil organizada, da família, organizações não-governamentais, sindicatos, lideranças religiosas e políticas, além de trazer à baila problemas antigos: Qual é a política social de sociedade? Qual a política pública educacional de Sociedade?

Fala-se atualmente em substituir uma política de governo por uma política de Estado. Vejo que precisamos partir para uma terceira possibilidade: mudança de política de governo para uma política pública de Sociedade, pensada a partir da complexidade de sociedades em constante transformação em todas as dimensões. É bem verdade que não basta mudar tipologias no campo teórico É urgente que se cumpra o que está estabelecido na Constituição Federal de 1988, considerada “Constituição Cidadã” por Ulisses Guimarães. Enquanto a Constituição está sendo rasgada, desrespeitada e descumprida, depara-se com todo tipo de desordem e violência.

Há quem grita com o silêncio (docentes) que padecem de uma formação distante da complexidade da vida humana e não humana; que sofre diante de mudanças bruscas na estrutura curricular, sem o devido conhecimento e participação efetiva no processo de construção de novas abordagens teórico-metodológicas; que sofre com o desrespeito e desvalorização de vários segmentos sociais; que padece de adoecimento em local de tralho; que é cobrado resultados sem uma contrapartida da sociedade e de governos, além de sobreviver com salário que ainda está longe de uma valorização efetiva.

O estudante é uma pessoa humana, antes de ser estudante, por isso precisamos examinar melhor nossas atitudes e palavras diante do acontecimento em evidência. Pelo próprio dinamismo social, educacional, político, econômico e e cultural do Brasil e do Distrito Federal, dá para avaliar com maior profundidade a aceleração da violência na escola. Vejo que violência na escola não pode ser solucionada excluindo o estudante da sala de aula, pois ao lado da escola  há fábricas de desvio social com toda a sua nudez. Se o docente possui seu silêncio produzido que assume a forma de grito do silêncio, há o grito do estudante que na condição de pessoa humana, responde ao silêncio de muita gente e instituições. Não há atitude humana em abstrato, sempre se experimenta o que se pensa e faz em termos societários.

Ao depredar um bem público (cadeira da escola), muitos estudantes alegam que se trata de uma “coisa pública”, podendo quebrar sem problema. Vejo essa atitude, por mais que seja sem a consciência da relação Sociedade, Indivíduo e Estado, como uma atitude reprodutora do modo de ser das lideranças políticas que apropriam da “coisa pública” e fazem o que bem querem, inclusive o desvio de recursos incontáveis que ajudam a produzir mais violência. Penso que o indivíduo seja impactado por um modo de pensar, de ser e de fazer política. É também impactado por um tipo de política educacional, claro que sem tirar a responsabilidade subjetiva do ato.

Enfim,não vejo como solução atacar o estudante enquanto um indivíduo isolado de seu contexto socioeconômico, político,cultural e educacional. Não dá para pensar de maneira unidimensional, nem ver a situação como a pior dos acontecimentos. Há violência estrutural que precisa ser melhor examinada para compreender a complexidade das atitudes, não apenas dos estudantes e docentes, mas do conjunto da sociedade. São muitas situações que estão imbricadas visíveis ou de maneira latente nesse acontecimento. Tenho a convicção que não se pode medir a pessoa humana por um ato, mas pelo conjunto, historicidade e cultura que dão uma direção aos atos.

O grito do silêncio de quem padece de toda ordem de negação de direitos é diferente do silêncio tácito de quem se cala por comodismo. É preciso que instituições sociais e agentes educativos promovam a sensibilidade e a prática do respeito da coisa “pública” e da pessoa humana, tornando as relações mais prazerosas e humanamente possíveis.

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*Cristino C. Rocha – é professor da escola pública do DF

 

 

 

Fonte: Blog do Washington Dourado

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