Câmara Legislativa: MP suspeita de provas destruídas

POR HELENA MADER E ANA VIRIATO – CORREIO BRAZILIENSE/REPRODUÇÃO

A um dia do julgamento que decidirá se Celina Leão poderá voltar ao comando da Câmara, promotores iniciam a terceira etapa da ação que investiga suposto esquema de propina. Câmeras flagraram servidores retirando documentos da Casa. 

 

Imagens do circuito interno da Câmara Legislativa flagraram movimentação de caixas, pastas e documentos em horários em que não havia expediente na Casa, como às 6h e em um sábado: sob investigação. …

 

Dois meses após o afastamento da cúpula da Câmara Legislativa, o Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) deflagrou ontem a terceira etapa da Operação Drácon, que teve como alvos ex-servidores dos deputados Celina Leão (PPS) e Bispo Renato (PR). O Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do MPDFT, apura a existência de uma “associação criminosa voltada à destruição de provas”. Segundo a investigação, Sandro Vieira, ex-braço direito de Celina, e Alexandre Cerqueira, ex-funcionário do gabinete de Bispo Renato, teriam retirado documentos da Câmara, poucos dias antes da primeira fase da ação. O Correio teve acesso às imagens em primeira mão. Em uma das fotos, um homem aparece empurrando um carrinho cheio de caixas e documentos, em um horário em que não havia expediente. Ele segura uma pasta, semelhante a uma mochila de laptop.

 

A nova etapa da Drácon ocorreu na véspera do julgamento que analisará o pedido de reconsideração do afastamento de Celina Leão da Presidência da Câmara. Hoje à tarde, os desembargadores do Conselho Especial decidirão se a parlamentar pode voltar ao comando da Casa ou se terá de se manter longe do comando do Legislativo local. Para o Ministério Público, a acusação de que servidores teriam tentado ocultar provas mostra a importância de a Mesa Diretora continuar afastada. A deputada Celina Leão, no entanto, afirma que seu ex-assessor não aparece carregando nenhum computador ou documento e aposta em um resultado positivo no julgamento de hoje à tarde (veja reportagem na página 20). Bispo Renato reafirmou inocência e declarou que as acusações são “infundadas”.

 

A nova etapa da Drácon foi deflagrada no início da manhã. Promotores cumpriram mandados de busca e apreensão na casa de Sandro Vieira e em uma casa lotérica de propriedade de Alexandre Cerqueira, no Setor Jardim Botânico. No estabelecimento comercial, os investigadores permaneceram por cerca de seis horas. Durante esse período, o serviço na lotérica permaneceu interrompido. Os dois ex-servidores, alvos de mandados de condução coercitiva, também prestaram depoimento. O MPDFT havia pedido a prisão de Alexandre, mas o desembargador José Divino, relator do processo na Justiça do DF, rejeitou essa solicitação.

 

O magistrado, entretanto, viu elementos de possível existência de ocultação de provas. “A imagem do circuito de videovigilância registrou que Sandro de Morais Vieira esteve nas dependências da Câmara Legislativa em 22 de agosto de 2016, em horário absolutamente não usual (cerca de 6h), e adentrou em outra sala às 6h17, onde também chegou outra pessoa não identificada, que, quase uma hora depois, saiu carregando uma caixa que aparentava conter documentos”, relatou o desembargador, na decisão. “Essa mesma pessoa não identificada retornou à sala em que Sandro Vieira se encontrava aproximadamente 20 segundos depois, e, em pouco menos de três minutos, outra pessoa não identificada se dirige ao referido recinto com a caixa já vazia em mãos”, acrescenta o magistrado, ao deferir as operações de ontem.

 

Na decisão, o desembargador afirma que Alexandre Braga Cerqueira também esteve na Câmara Legislativa no sábado anterior à operação de busca e apreensão, às 10h38. “O quadro delineado demonstra o claro propósito do investigado Alexandre em interferir nas investigações, sendo imprescindível esclarecer com máxima urgência quais foram os documentos e objetos subtraídos do interior da Câmara Legislativa”, afirmou José Divino.

 

Afastamento

 

Em entrevista coletiva na manhã de ontem, pouco depois da realização das buscas, o coordenador do Gaeco, promotor Clayton Germano, explicou que a terceira etapa da Drácon é decorrência da análise do material apreendido nas duas fases anteriores (leia Memória). “A quantidade de material é muito grande, só as filmagens do circuito interno da Câmara Legislativa tinham 8 tera (bytes)”, contou o promotor. Para ele, os novos fatos demonstram “a importância da medida cautelar que determinou o afastamento da Mesa Diretora”.

 

Clayton lembrou que o presidente da Associação Brasiliense de Construtores, Afonso Assad, afirmou, em depoimento ao MPDFT, que Alexandre Cerqueira teria atuado como emissário no suposto esquema de cobrança de propina. Esse é um dos motivos pelos quais os promotores pediram a prisão de Alexandre, mas não apresentou o mesmo pedido com relação a Sandro Vieira.

 

Ao contrário das etapas anteriores da Operação Drácon, a Polícia Civil do DF não participou das buscas e das conduções coercitiva de ontem. Mas o coordenador do Gaeco afirmou que as duas instituições ainda atuam de forma colaborativa. “As imagens do sistema interno da Câmara foram analisadas pelo Instituto de Criminalística da Polícia Civil”, lembrou Clayton Germano.

 

A terceira fase da Drácon também ocorreu em casa lotérica de Alexandre Cerqueira, no Setor Jardim Botânico

 

Memória

 

Emendas e propinas

 

A Polícia Civil e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) deflagraram, em 23 de agosto, a Operação Drácon. A ação, motivada pela entrega de áudios de deputados distritais gravados por Liliane Roriz (PTB), investiga um suposto esquema de uso de emenda parlamentar para o pagamento de unidades de terapia intensiva (UTIs) mediante cobrança de propina. O conchavo, conhecido como UTIgate, seria integrado pelos membros da Mesa Diretora afastados pela Justiça: Celina Leão (PPS), Raimundo Ribeiro (PPS), Bispo Renato Andrade (PR) e Julio Cesar (PRB); além de Cristiano Araújo (PSD).

 

Na primeira fase da operação, cumpriram-se mandados de busca e apreensão nos gabinetes e nas casas dos parlamentares envolvidos, com o intuito de buscar indícios que confirmassem a existência da articulação. Após as primeiras ações da Polícia Civil, o distrital Chico Vigilante (PT) afirmou que um servidor da Câmara Legislativa o informou sobre retiradas de provas da Casa. Assim, em 2 de setembro, pela segunda etapa da ação, a Polícia Civil voltou ao Legislativo local. Dessa vez, para apurar a possibilidade de destruição ou alteração de evidências referentes ao caso.

 

“Pirotecnia”, diz Celina Leão

 

A presidente afastada da Casa e o distrital Bispo Renato negam que tenham pedido para ex-servidores ligados aos gabinetes deles recolherem documentos e equipamentos pouco antes de deflagrada a ação

 

POR HELENA MADER e ANA VIRIATO – Especial para o Correio

 

Celina Leão (PPS): “Os desembargadores poderão comprovar a verdade”

 

A presidente afastada da Câmara Legislativa, deputada Celina Leão (PPS), criticou a realização da terceira etapa da Operação Drácon na véspera da decisão da Justiça sobre a sua possível recondução ao cargo. Para ela, as buscas foram “um show de pirotecnia”. Mas a parlamentar garante que se mantém otimista quanto ao resultado do julgamento. “Os desembargadores têm acesso aos autos e poderão comprovar a verdade”, declarou a deputada.

 

O Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) não fez acusações de que a retirada de documentos teria sido feita por ordem dos deputados distritais envolvidos na Drácon, mas declarou que é preciso investigar “por que e a mando de quem” houve o transporte de documentos para fora da Casa. Celina Leão voltou a negar envolvimento no episódio e disse, ainda, que Sandro Vieira, seu ex-assessor, não aparece carregando documentos ou máquinas. A parlamentar do PPS reafirma que não houve retirada de computadores da Câmara Legislativa e, para ela, o laudo do Instituto de Criminalística corrobora esse entendimento. Celina também alega que a distrital Liliane Roriz mentiu ao MPDFT. “Tanto é que ela teve que retificar seu depoimento ao MP antes da segunda fase da Drácon”, comentou a presidente afastada.

 

Bispo Renato (PR): “O esclarecimento dos fatos é necessário”

 

O advogado de Celina, Eduardo Toledo, também comentou o fato de a nova fase da Drácon ser deflagrada um dia antes de o Conselho Especial do Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT) analisar o pedido de reconsideração do afastamento da parlamentar. “A realização da terceira etapa da operação foi deferida pela Justiça em 11 de outubro. Se havia risco de destruição de provas, por que o Ministério Público esperou quase uma semana e realizou a operação um dia antes do julgamento?”, questionou Toledo. “O que justifica uma operação dessa natureza dois meses após a realização da primeira?”, acrescentou.

 

Segundo Toledo, depois da denúncia sobre a possível retirada de computadores da Câmara Legislativa, todos os funcionários do gabinete de Celina Leão foram orientados a ir ao MPDFT prestar esclarecimentos. O advogado destacou alguns dos principais pontos da defesa. O primeiro questionamento é relativo ao áudio da conversa entre Celina Leão e Liliane Roriz. Toledo defendeu que houve uma edição, que suprimiu um importante trecho da conversa. “Houve uma fragmentação dolosa desse material, retirando o trecho em que Celina afirma que não esteve com empresário e que não queria nada”, explica. Ele cita, ainda, o depoimento do empresário Afonso Assad, no qual não houve menção ao nome de Celina. “Se o Ministério Público tem tanta certeza de que houve crime, por que ainda não ofereceu denúncia?”, perguntou o advogado.

 

“Infundadas”

O distrital Bispo Renato Andrade (PR), afastado da 3ª Secretaria da Câmara Legislativa, alegou, em nota, não saber de atos ilícitos supostamente cometidos por seu ex-servidor Alexandre Braga Cerqueira. O parlamentar reafirmou inocência e reiterou que as acusações contra ele são infundadas. “O esclarecimento dos fatos é necessário e se dará no momento certo”, frisou. Alexandre foi afastado do cargo de secretário executivo dois dias após a deflagração da Drácon e teve a exoneração publicada no Diário da Câmara Legislativa em 1º de setembro. O ex-servidor não foi encontrado para comentar as denúncias do MPDFT.

 

A defesa de Sandro Vieira esclareceu que entradas e saídas do gabinete eram usuais porque, à época, ele era secretário legislativo. Segundo os advogados, após a Drácon, o ex-braço direito de Celina Leão pediu exoneração e passou a ocupar o cargo de assessor, com salário menor, para colaborar com as investigações. De acordo com a defesa, Sandro está “tranquilo” em relação à nova fase da operação.

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