DEFENSORIA PÚBLICA DO DF: 650 MIL ATENDIMENTOS. E DAÍ?

O Correio Braziliense divulgou que a Defensoria Pública do Distrito Federal atendeu mais de 650 mil pessoas em 2009. A notícia fala dos atendimentos da Secretaria de Justiça e Cidadania que teriam superado mais de três milhões de atendimento. Na matéria diz que o serviço “na hora” com mais de 2,7 milhões de registro foi o órgão com maior atendimento.

Vale, contudo, deixar claro que a Defensoria Pública funciona nos postos do “na hora” e que muitos atendimentos creditados ao setor foram realizados pela Defensoria. Também merece registro que muitos atendimentos da Defensoria Pública acontecem em audiências e que tais atendimentos não são computados no número total de pessoas assistidas pela Defensoria. É comum a Defensoria Pública atender presos, pessoas ausentes, funcionar como curadora de menores e em tantas outras situações que não cabe aqui descrever e que não anotadas como atendimentos. Na verdade, o número de pessoas atendidas é um dado relativo e que não evidencia a complexidade dos serviços da Defensoria Pública. O número de atendimentos é um dado de somenos importância.

Pode acontecer que em uma semana inteira um defensor cuide de um processo em julgamento no tribunal do júri e que, ao final, alguém seja inocentado de um crime que não cometeu, ou, ainda, que ao final, o réu seja condenado, mas que a defesa –  firme e forte –  garanta a pena justa. Garantir o direito de defesa é uma missão que não pode ser reduzida em número de atendimentos. Um único atendimento, mas que pode impedir a ocorrência de um erro judiciário. Em outras hipóteses, defensores públicos vão garantir que crianças recebam pensão alimentícia ou que tenham o nome de seus genitores em seus documentos. Garantir alimentos, garantir cidadania, ainda que para uma única pessoa, é algo de relevante. O defensor defende o doente, quando o estado lhe nega um SUS decente, a criança abandonada pelos pais, o acidentado em razão do trabalho. Defende o inocente e defende o culpado (que só pode ser assim declarado após o devido processo legal, que não existe sem defesa).

O meu discurso é suspeito, afinal sou Defensor Público. Posso ser acusado de querer emprestar uma nobreza superior a merecida pelo mister que exerço. As pessoas que já foram atendidas é que devem dizer a nossa importância. Não o frio número de atendimentos, cuja única valia é dimensionar o número de pessoas que precisam dos nossos serviços.

Partindo, então, do pressuposto de que o serviço é essencial, de que é a porta de entrada para resguardo da cidadania, cabe o meu desabafo. O Defensor Público não é valorizado, não é respeitado. É um desabafo pessoal, meu, exclusivamente meu, e que não significa a posição da instituição ou dos demais defensores. Cada um fala por si.

Não reclamarei do salário, embora queira um aumento. Ressinto me de uma estrutura  digna de trabalho, de independência funcional, de não ver interferências políticas no trabalho. É desanimador tentar fazer um trabalho decente e ser perseguido por pessoas com interesses inconfessáveis. É duro ver decisões administrativas que consultam interesses políticos, nem sempre de caráter republicano, em detrimento do serviço.

Sim, talvez tenhamos atendido quase um milhão de pessoas. Número vistoso e que rende discursos belíssimos. Não vejo ninguém querendo saber a qualidade do atendimento, comprometida por falta de estrutura, por falta de órgãos de auxílio. Se eu fosse usuário do serviço da Defensoria Pública eu estaria insatisfeito.

Com certeza muitos colegas ficarão indispostos comigo, caso vejam essa declaração, mas, se eu fosse cliente da Defensoria Pública eu estaria insatisfeito. Estaria muito insatisfeito, apesar de reconhecer o esforço dos defensores.

O trabalho pode ser melhor desenvolvido, mas, para tanto, é preciso de espaço físico decente para trabalhar, para receber o cliente. É preciso quadro de apoio concursado, não servidores cedidos (muitos são bons e comprometidos, mas alguns só estão ali por força de indicação política), precisamos de computadores, rede de informática e tantas outras coisas. Precisamos, também, de defensores públicos, e que os que não fazem política, que não se interessam em ocupar os cargos de direção do órgão ou da associação sejam valorizados, respeitados e recebam condições dignas de trabalho.

Com certeza atendi uma parcela das pessoas mencionadas nas estatísticas, para elas, apenas posso pedir desculpas, era possível atender-lhes melhor, desenvolver um trabalho mais eficiente, mas não me deram os meios, pois para os que comemoram os 650 mil atendimentos, basta o número que os cacifa politicamente. Espero que no próximo ano possamos dizer, atendemos XX pessoas, com qualidade, com a estrutura que os assistidos merecem ser recepcionados.

Repito, cuida-se de opinião pessoal minha, o meu trabalho poderia ter sido melhor e a opinião aqui externada não reflete, necessariamente, a opinião de nenhum outro defensor. É bom ressaltar, antes que a facção que se posta ao lado do “dono” da defensoria pública comece o apedrejamento. André de Moura, defensor público.

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