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    Manual de nomeação para amantes conspiradores

    A cada novo amanhecer, Daniela Min e Isaquias Gargamel acordam menos amantes e mais ministros em potencial. O flerte agora é com o poder maior, e a Educação, outrora trincheira e laboratório, tornou-se trampolim. Sussurram juntos sobre outros gabinetes, outras pastas — Cultura, Comunicação, até a cobiçada Casa Civil — como se escolhessem destinos em um mapa de guerra.

    Daniela sonha com uma secretaria inteira para chamar de sua, onde possa modelar políticas públicas como quem aplica sombra nos olhos: com precisão cirúrgica e vaidade velada. Isaquias, mais discreto e mais ambicioso, almeja um cargo técnico de onde possa puxar as cordas de múltiplas marionetes, silenciar vozes, escolher quem sobe e quem desaparece. Ele quer o controle da engrenagem, ela quer a assinatura nos decretos.

    Para pavimentar o caminho, contam com uma rede de espiões cada vez mais capilarizada. Entre os mais devotados, destaca-se a “professora da voz criança” — uma pedagoga de fala doce e ouvidos treinados para captar conspirações em conversas de sala dos professores. Com sua imagem de educadora angelical, ninguém suspeita que ela envia relatórios semanais sobre possíveis dissidentes. As informações são anotadas à mão, em cadernos coloridos de capa infantil, e entregues em encontros disfarçados de cafés pedagógicos.

    E não são apenas professores no radar. Há um técnico da TI que copia e-mails sigilosos; um vigilante noturno que fotografa pastas esquecidas sobre mesas; e uma analista de políticas públicas que envia dossiês dentro de documentos falsamente inócuos. Todos trabalham sem saber ao certo o alcance da rede, apenas sentem a teia apertando.

    A próxima ofensiva, dizem, será no setor de Avaliação de Desempenho. Planejam manipular métricas, plantar falhas em servidores incômodos, fabricar avaliações que justifiquem exonerações. É o poder travestido de meritocracia, a vingança disfarçada de política pública.

    Enquanto isso, no apartamento escondido na Asa Norte, o casal segue escrevendo, a quatro mãos e duas taças de vinho, um roteiro de poder com tintas de paranoia. Porque para Daniela e Isaquias, a realidade não é suficiente. Eles querem reescrevê-la. E quem lê nas entrelinhas já sabe: esse romance não termina em tragédia nem redenção. Termina em nomeação.

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