Documentos sigilosos em poder do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ligam o nome do deputado Eunício Oliveira (PMDB-CE), candidato a senador, a um esquema de divisão de contratos de vigilância no governo do Distrito Federal, um mercado que move mais de R$ 200 milhões por ano.
Ao lado de Eunício, dentro do suposto jogo de cartas marcadas, aparecem dois deputados distritais, Cristiano Araújo (PTB) e Eliana Pedrosa (DEM), candidatos à reeleição em outubro. Os três comandam ou têm familiares na direção de empresas que fornecem mão de obra terceirizada a órgãos públicos.
Os nomes de Eunício, Cristiano e Eliana estão numa planilha apreendida no gabinete de José Geraldo Maciel, ex-chefe da Casa Civil no governo de José Roberto Arruda. O documento foi anexado, com o laudo 072/2010, no relatório final da Polícia Federal, revelado ontem pelo Estado, sobre o “mensalão do DEM” em Brasília. Segundo a conclusão policial, Maciel “ocupou posição central no esquema de corrupção montado na administração”.
Concentrava-se no seu gabinete, no 11.º andar do Palácio do Buriti, boa parte das ordens financeiras e políticas do governo de Arruda, cassado e apontado pela PF como chefe de uma “organização criminosa”.
No arquivo encontrado no seu computador, Maciel relata a Arruda a insatisfação de Cristiano Araújo e Eliana Pedrosa com o crescimento de Eunício Oliveira nos contratos com o governo do DF. O deputado do PMDB é dono da Confederal Vigilância e Transporte de Valores, empresa que recebeu, pelo menos, R$ 55 milhões do governo do DF nos últimos quatro anos. “Governador: Deputado Cristiano Araújo me procurou hoje logo cedo. Ele estava angustiado. Acabou de perder mais um lote de vigilância”, diz Maciel no documento. Ele continua: “Cristiano diz que Eunício está neste momento com os seguintes contratos: Secretaria de Saúde, Secretaria de Esporte, Secretaria de Educação – Merendeiras, Secretaria de Planejamento, Tesouraria dos Estádios, Projeto 3.ª Merenda e está em vias de pegar um lote na Educação, o que contraria a Eliana”.
É a PF quem identifica Eunício como sendo “Eunício Lopes de Oliveira”, nome completo do deputado e ex-ministro das Comunicações.
“Cristiano informa que está encaminhado para Eunício ficar com o Lote da Eliana. Ela já me procurou para demonstrar aborrecimento”, reforça o ex-chefe da Casa Civil numa anotação feita em um quadro onde mostra como seria a divisão dos contratos, tornando as licitações ou contratações diretas meras formalidades para encobrir os arranjos prévios.
Na tabela, há os nomes dos três políticos, do empresário Nelson Lawal e de um Leonardo – a PF acredita ser o ex-deputado Leonardo Prudente, que renunciou ao mandato depois de ser flagrado botando dinheiro nas meias. Filhos dele comandam uma empresa de segurança no DF.
Contratos. No dia 23 de outubro de 2009, ainda no governo Arruda, a Confederal assinou, por exemplo, um contrato de R$ 2,4 milhões sem licitação. À Justiça Eleitoral, Eunício Oliveira, do alto escalão do PMDB nacional, declarou ser dono de 98,9% da empresa. Seu patrimônio é de R$ 36,7 milhões. O nome de Eunício chegou a ser citado num documento da PF em que a polícia suspeitava dos repasses a uma outra empresa dele, a Manchester. Agora, é a primeira vez que o peemedebista é mencionado em um documento feito por um alto integrante do governo Arruda indicando a suposta participação de empresas dele num esquema de rateio de contratos públicos.
Pais e tios de Cristiano dirigem a Fiança e a Ipanema, grandes empresas do ramo da terceirização, incluindo a vigilância. Entre 2007 e 2009, só a Fiança Segurança faturou R$ 218 milhões. Um filho de Eliana e uma irmã comandam empresas de terceirização na cidade, Esparta e Dinâmica. Juntas, levaram mais de R$ 135 milhões em contratos com o governo do DF desde 2007.
Ontem, o Estado procurou Eunício. Por meio de sua assessoria, ele informou que não se manifestaria. Alegou que se afastou da direção dos negócios desde 1998. A reportagem procurou Ricardo Augusto, indicado por Eunício para falar em nome da empresa. Mas ele não respondeu até o fechamento da edição. Procurados nos gabinetes, Eliana Pedrosa e Cristiano Araújo não foram localizados. Os dois eram da base de apoio do governo de Arruda. Eliana foi secretária de Desenvolvimento Social na gestão do ex-governador. A deputada declarou este ano patrimônio de R$ 7,1 milhões à Justiça Eleitoral. Já Cristiano Araújo afirmou possuir em R$ 1 milhão em bens, entre eles um carro Porsche (R$ 266 mil).
Valores milionários
R$ 55 milhões
é o valor que a empresa Confederal teria recebido do governo do DF nos últimos 4 anos
R$ 36 milhões
é o patrimônio declarado por Eunício de Oliveira