Propina em emendas da saúde seria dividida em 6 partes, diz Liliane Roriz

Liliane falou à TV Globo; Celina e ex-secretário-geral estão entre suspeitos.
Distrital entregou conversas gravadas ao MP, que apura suposto esquema.

Do G1 DF

Investigação comandada pelo Ministério Público do Distrito Federal com base em áudios gravados pela deputada distrital Liliane Roriz (PTB) aponta a existência de um esquema de corrupção na Mesa Diretora da Câmara Legislativa. Segundo a parlamentar, o acordo usava emendas para desviar recursos de áreas como educação e saúde. Trechos das gravações foram divulgados nesta quarta-feira (17) (veja vídeo).

Em entrevista exclusiva à TV Globo nesta quarta, Liliane detalhou parte do suposto acordo. Segundo ela, a negociação tratava de uma “sobra orçamentária” de R$ 30 milhões, destinada originalmente à reforma de escolas e unidades de saúde. No começo de dezembro, os distritais aprovaram uma mudança no texto, direcionando o aporte para pagar dívidas do Palácio do Buriti com prestadoras de serviço em UTIs.

“[O dia da gravação] Foi quando eu comecei a entender as coisas, que já tinha um negócio que estava sendo concluído por um deputado. Que esse deputado estava trazendo esse negócio e que esse negócio seria dividido em seis partes, e que seriam R$ 30 milhões. Eu não sabia de onde vinha, nem tampouco o percentual disso”, diz a distrital.

Os áudios foram gravados em dezembro de 2015, logo após a votação do texto. No diálogo, a presidente da Câmara, deputada Celina Leão (PPS), conversa com Liliane sobre “o negócio do recurso”, e diz que vai incluir a vice-presidente da Casa “no projeto”. Liliane diz que a conversa ocorreu porque ela ficou “muito contrariada, muito chateada” com a alteração no destino das verbas.

“É que eu chamei eles lá na hora, aquela hora que eu chamei, e falei: olha, Liliane está no projeto, porque eu já tinha atendido ela. Quer botar em outro lugar, e não quer botar no ‘grupo’. Ela tá no grupo, ela está no projeto com a gente. Ficou definido. Então, hoje, a gente vai falar com o secretário de Saúde que a gente fez o negócio. Então, só para te avisar, a gente vai falar com o secretário que o recurso foi para lá”, diz Celina na gravação.

Deixa eu contar. O que aconteceu? Hoje, nós vamos falar com o secretário de Saúde. A gente colocou recurso para ele agilizar a… o negócio do recurso. Mas você tá no projeto, entendeu? Você não tá fora do projeto não. Você tá no projeto, mandei Valério falar com você”
Celina Leão (PPS), em áudio

“Deixa eu contar. O que aconteceu? Hoje, nós vamos falar com o secretário de Saúde. A gente colocou recurso para ele agilizar a… o negócio do recurso. Mas você tá no projeto, entendeu? Você não tá fora do projeto não. Você tá no projeto, mandei Valério falar com você”, continua a presidente da Câmara.

Segundo Liliane, o “projeto” citado era um esquema para direcionar dinheiro às empresas que atuam em hospitais públicos e receber propina, em troca. O G1 e a TV Globo tentaram contato com Celina por telefone e no prédio da Câmara, nesta quarta, mas não obtiveram retorno. O G1 e a TV Globo também não conseguiram contato com a defesa do ex-secretário-geral da Câmara, Valério Neves.

Deputados citados
Em outro áudio, Liliane conversa com Valério sobre a destinação dos mesmos recursos. O então secretário-geral da Câmara Legislativa do DF diz que a mudança ocorreu porque o esquema com um outro empresário tinha dado errado.

Liliane Roriz: Valério, me explica aquela história que eu não entendi.
Valério Neves: O que aconteceu? Tinha feito um negócio com o menino… O Afonso [inaudível]. Aí, o Bispo Renato e o Júlio [César] sentaram com o Afonso. [inaudível] E nada do compromisso com o grupo, que são seis pessoas. Você, Renato, a Mesa mais o Cristiano [Araújo].
[…]
Valério: Agora, se não tem compromisso… O Cristiano arrumou aquela parceria dele com as UTIs, e que nessa UTI teria [compromisso]. E aí, passou dinheiro para a UTI.

Os trechos fazem referência à composição da Mesa Diretora. Além de Celina e Liliane, presidente e vice, a formação inclui o primeiro secretário, Raimundo Ribeiro (PPS), o segundo secretário e líder do governo, Julio Cesar (PRB), e o terceiro secretário, Bispo Renato Andrade (PR). Destes, apenas Ribeiro não é citado nominalmente nos áudios divulgados.

O governador Rodrigo Rollemberg, a presidente da Câmara Legislativa, deputada distrital Celina Leão, a vice-presidente da Câmara Legislativa, deputada distrital Liliane Roriz, durante evento de homenagem ao ex-governador Joaquim Roriz em 2015 (Foto: Tony Winston/Agência Brasília)O governador Rodrigo Rollemberg, a presidente da Câmara Legislativa, deputada distrital Celina Leão, a vice-presidente da Câmara Legislativa, deputada distrital Liliane Roriz, durante evento de homenagem ao ex-governador Joaquim Roriz em 2015 (Foto: Tony Winston/Agência Brasília)

O deputado Cristiano Araújo (PSD) não compõe a Mesa Diretora da Câmara mas, segundo Liliane, fazia parte do esquema de favorecimento das empresas. A distrital disse que entregou as gravações ao Ministério Público porque tinha certeza da existência de acordos de corrupção.

Em entrevista à TV Globo, o promotor de Defesa da Saúde do MP Jairo Bisol afirmou que a investigação está em curso. “Todas essas oitivas, todos esses fatos novos investigados estão corroborando cada vez mais a denúncia da deputada Liliane Roriz. Os indícios todos apontam para ilícito administrativo, sim, certamente. E há, potencialmente, ilícitos penais”, declarou.

Em visita à Câmara nesta quinta, a reportagem da TV Globo não conseguiu encontrar os deputados Cristiano Araújo, Bispo Renato Andrade e Julio Cesar. Em nota, Andrade disse que está “se inteirando” da investigação e negou que tenha praticado ato ilícito.

Mesa nega crimes
Em nota divulgada no site da Casa, a Mesa Diretora da Câmara diz que a emenda responsável por alterar o destino dos R$ 30 milhões foi proposta pela própria Liliane Roriz e que os áudios estão “evidentemente editados, e as conversas estão fora de contexto”. A Mesa diz rejeitar “qualquer acusação da prática de ilícito” e “confiar nas investigações”.

O texto, de dois parágrafos, diz que a Mesa investiga Liliane em três processos, por prática de atos ilícitos e quebra de decoro parlamentar. Segundo a mensagem, a distrital pode perder o mandato em razão dessas suspeitas.

Renúncia ao cargo
No início da tarde, Liliane Roriz divulgou documento em que renuncia à vice-presidência da Câmara. A assessoria de Liliane informou que a decisão foi tomada por “motivo de foro íntimo”.

A parlamentar renuncia ao cargo no dia do julgamento dela na 5ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal por lavagem de dinheiro – ela é acusada de receber dois dois apartamentos em Águas Claras de empresa beneficiada por operação irregular durante o governo de Joaquim Roriz, pai da deputada. Por falta de quórum, a análise foi adiada.

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