RESSENTIMENTO NO CARNAVAL

O que leva uma pessoa a comparecer a um bloco de carnaval, em que deveria reinar alegria e festa, e sair furando os foliões com uma faca?

Alguém dirá que o criminoso pertence a uma gangue e descarregou sua vingança contra rivais que estavam na folia. No entanto, não foi isso o que se viu em um bloco carnavalesco de Brasília.

O autor das facadas, hoje com 19 anos, demonstra, desde cedo, comportamento antissocial. Já foi apreendido várias vezes por atos infracionais, mas nenhuma reprimenda o corrigiu.

Quando internado no Sistema Socioeducativo, adotou a postura enganadora da maioria dos infratores: mostrou-se humilde, coitado, vítima das circunstâncias.

Não quero negar a importância do meio no comportamento e na formação do caráter do jovem. Ele, porém, com diz Chico Buarque, é um pote até aqui de mágoas que transbordou e se transformou em ressentimento.

O escritor norteamericano Orison Swett Marden, autor de A alegria de viver, pontua: “Quando, na vida, uma porta se fecha para nós, há sempre outra que nos abre. Em geral, porém, olhamos com tanto pesar e ressentimento para a porta fechada, que não nos apercebemos da outra que se abriu”.

O filósofo alemão Friedrich Nietzsche dizia que a paixão do ressentimento era o que mais deprimia o ser humano, assinalando: “A descarga de afeto é para o sofredor a maior tentativa de alívio, de entorpecimento, seu involuntariamente ansiado narcótico para tormentos de qualquer espécie” – em Genealogia da Moral, 3a. parte, §15.

Na obra A cura do ressentimento, Padre Léo (1961-2007) alerta: “A mágoa não trabalhada e o sentimento não assumido e não perdoado que nutrimos por uma pessoa acabarão por dar origens a novas mágoas e a novos ressentimentos. É um terrível círculo vicioso”.

Não eram os inimigos de outra gangue que ele esfaqueava no carnaval; era a própria sociedade, objeto de sua raiva, que sofria os golpes de peixeira.
Miguel Lucena – Delegado da PCDF e jornalista