Transporte: tarifa atual é insustentável, diz ex-diretor do DFTrans

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Ex-diretor do DFTrans se defende de suspeitas levantadas contra gestão e comenta a precariedade do transporte público da capital
Eric Zambon
eric.zambon@jornaldebrasilia.com.br
Ao levantar a hipótese de “relação privilegiada” entre a viação Pioneira e a gestão anterior do GDF, o atual secretário de Mobilidade, Carlos Tomé, pisou no calo do ex-diretor do DFTrans, Jair Tedeschi. “Ele falou besteira”, critica. Jair ficou apenas sete meses no cargo, mas afirma ter enfrentado falta de recursos e duvida que o governo Rollemberg termine o mandato sem aumentar o preço das passagens, pois o sistema já opera em déficit.

Condenado por improbidade administrativa pelo Tribunal de Contas, quando à frente do Detran-DF, em 2008, ele se defende e se mostra tranquilo quanto à repercussão do caso. Como cidadão de Brasília “há 50 anos”, ele espera, apenas, que alternativas como o BRT e as integrações funcionem como deveriam.

O senhor cogitou que as declarações do secretário tenham sido fruto de desconhecimento ou má-fé. Por que?

Desde o início de novembro fomos informando (à equipe de transição) tudo que era necessário. Tive apenas um contato com o Tomé e fiz questão de perguntar a ele se tinha dúvida. A resposta foi não. Ele disse que, ao contrário, tínhamos informado até mais do que nos fora pedido. Como agora ele vem falar em privilégio? Realmente me aborreço com isso. Sou extremamente cordato. As pessoas têm direito de expressar suas opiniões, mas ele falou besteira.

O secretário chegou a dizer que a forma de pagamento da empresa, paga pela quilometragem rodada, afrontava a lei. Isso procede?

As empresas que operaram na Copa faziam o transporte gratuito das pessoas da Rodoviária e eram pagas por quilômetro rodado. Era uma forma de remuneração quando você não tinha como saber o número de passageiros. Ele (Tomé) se diz especialista na área, então tem que ter conhecimento. Ele teve desconhecimento porque não leu os documentos encaminhados ou, então, calculo realmente que agiu de má-fé, e aí não aceito, é molecagem.

O governo utiliza muito a desculpa de que a culpa é da gestão anterior…

O que avançou em dois meses? A situação infelizmente piorou. Vá ao BRT e veja como é o sufoco para entrar nos ônibus. Levamos de três a quatro meses para organizar o embarque. Primeiro vem os passageiros com necessidade especial, o idoso, depois tem a fila pra quem vai sentado… Você tinha ônibus de cinco em cinco minutos e ninguém chiava. Continuam de cinco em cinco minutos, mas agora é uma multidão para entrar.

Nos sete meses em que esteve à frente do DFTrans, quais os principais problemas inerentes à gestão de mobilidade?

Tínhamos uma frota sucateada. Existia até bolão para saber quantos ônibus quebrados seriam encontrados nas vias e o governo teve coragem de renovar a frota. O secretario está certo ao dizer que os ônibus novos foram colocados no sistema velho. São cinco BRTs previstos, por exemplo, mas mal conseguimos concluir um. Existem terminais em reforma, existem terminais a serem construídos, outros têm que ser reconstruídos, então foram diversos fatores em que o governo anterior falhou. Confesso que tive dificuldade de encarar novembro e dezembro no DFTrans ano passado por falta de recursos e governo semi-paralisado…

Por que faltou dinheiro?

Isso é fruto de não elevar a tarifa. Não acredito que o governo Rollemberg consiga terminar sem ter reajuste tarifário. O sistema adotado é bom para o usuário, mas ruim para o governo. O sistema determina que devo remunerar a empresa pelo custo dela, que hoje está acima de R$ 4 (por pessoa). A tarifa técnica (custo do transporte dividido pelo número de passageiros pagantes) está num custo médio de R$ 3,15 hoje. Então quando o passageiro faz o acesso a R$ 3, o governo já tem que pagar a diferença. Quando ele faz a integração e pega o segundo ônibus, então, o governo paga a passagem toda.

A Secretaria de Fazenda ou a de Planejamento deu alguma explicação sobre a falta de recursos?

Estão dizendo agora que o orçamento está subestimado, só que ninguém faz orçamento superavitário. Pensam “ah, depois tem suplementação”, mas às vezes não tem. O governo apostou no ganho por conta do servidor. O GDF apostou que os aumentos dados não só para servidor – rodoviários tiveram 20% de reajuste – alavancariam o governo politicamente e ele venceria as eleições e teria mais quatro anos de mandato. Não pegou.

Então, houve mais gastos do que deveria…

Entendo que quando se viu que não tinha como buscar mais recurso, era final do ano. Aí começaram a apagar a luz, fechar torneira, mas aí já era tarde demais.

A integração prejudica financeiramente o sistema público de transporte?

Com certeza. Mas o governo tem que bancar, até porque na campanha o governador falava em bilhete único, então ele não pode mudar esse discurso agora. Isso traz custo para o governo, que banca as passagens, mas são detalhes. O secretário, como técnico da área, diz que a visão do futuro é a integração, o sistema tronco modal (em alusão ao BRT). Então faça acontecer! Deixe de falar sobre o governo passado… Eu sou de Brasília, quero que aconteça no novo governo, quero que o novo governo faça as mudanças!

Como o senhor avaliaria a eficiência do DFTrans?

Algumas coisas são complicadas. Por briga política, a fiscalização saiu do DFTrans em março (de 2014) e foi transferida para a Secretaria de Transportes. Como órgão gestor, passou a não fiscalizar mais, não punir. Perdeu a capacidade de estar em cima da empresa, cobrando.

A partir de agosto teve questão dos recursos financeiros e também não conseguimos terminar o BRT até hoje. Os terminais não foram concluídos, então não tinha como mexer no principal, as integrações, as racionalizações de linha que poderiam melhorar ou diminuir o custo.

Foram implantados ônibus novos em cima de mil linhas aproximadamente, e não era para ser isso. A responsabilidade era do DFTrans, e não conseguimos.

As obras do BRT são de responsabilidade das empresas do consórcio. Elas só trabalhavam quando os repasses eram feitos?

Eles tinham um contrato a cumprir, mas chegou um ponto tal que também iam cobrando. Começaram com um “ah, não tenho dinheiro pra comprar material”. Alegavam essas dificuldades.

E isso era um problema do DFTrans?

Não, mas quem era o gestor? a quem afeta? Afeta a população, então o DFTrans tinha que agir. Eu falava: “não é possível que vocês (empresas) não consigam terminar a estação”!

Então a culpa é das empresas?

Não, é um conjunto de fatores que não permitiu…

Mas se existe um contrato e as empresas têm que terminar as obras. Elas não cumprirem não seria responsabilidade delas?

Tem tanta coisa que podem alegar (risos). Demorou a sair o licenciamento, demorou a sair isso, a sair aquilo… Teve a briga para tirar o pessoal da estação Floricultura – e isso era problema do governo -, então são vários fatores.

E quanto à “operação branca” do BRT?

Com três meses era esperado que fosse feita a montagem de tudo e fosse feita a cobrança aos passageiros, mas não foi assim. Estão anunciando a cobrança para daqui a 15 dias, mas não vai ser fácil. Eu acho que não vão conseguir, mas se conseguirem, eu aplaudo. Não há catracas com validadores nas entradas das estações. […] São detalhes que infelizmente não são da minha época, mas nós tivemos dificuldade e eu fui crítico disso. Como é que você consegue fazer a operacionalização do sistema desse jeito?

Outra questão muito delicada são as constantes greves…

A partir de agosto o orçamento se esvaiu. No caso das empresas, existem três tipos de transferência de recursos. O primeiro é pelo vale- trabalhador. O passageiro adquire crédito e paga R$ 3 com a integração, se for com dinheiro paga passagem por passagem. As empresas recebem esse dinheiro porque ele não vai para o Tesouro, fica em uma conta específica e a medida que você usa seus créditos, esse dinheiro é repassado, conforme o número de acessos (aos ônibus da empresa).

O que aconteceu é que a tarifa técnica passou dos R$ 3 o governo tinha que colocar subsídio, mas não tinha dinheiro (para repassar às empresas, que portanto atrasaram no pagamento de funcionários e geraram greves).

É possível dizer que houve avanço?

Digo o seguinte: em 2008, o Arruda e o Fraga tiveram a coragem de tirar o transporte pirata, criaram as cooperativas. Foi uma coragem também de tirar os camelôs das ruas. O governo Agnelo teve a coragem de tirar os ônibus velhos.

As cooperativas que ainda têm ônibus velhos devem renovar a frota este ano, e a isso o governo Rollemberg tem que estar ligado. Os contratos de 2008 são válidos por dez anos, mas com prazo de renovação de sete anos, mesmo sem a certeza de revalidação do contrato. Aí já é uma questão do governo.

Mas muita coisa não foi feita…

Se fôssemos reclamar, falaríamos que o Arruda fez a linha verde, a EPTG, mas cadê os ônibus com a porta na esquerda e tal? O governo Agnelo não fez e o atual governo também não.

Quando você se candidata e lança sua plataforma, seus projetos, esqueça o que não foi feito, passe a fazer! “Ah, mas o rombo da economia…”. Isso são dificuldades, mas não impedem o governo de avançar. Não adianta ficar reclamando. Até hoje reclamam da ditadura, mas já tem 30 anos que acabou, então para que ficar reclamando sobre isso? Tem que trabalhar!

E quanto à condenação por improbidade administrativa quando o senhor era diretor do Detran-DF?

Isso aí foi uma sacanagem! Eu era obrigado a fazer registro de veículo alienado. Na época, ou você montava um cartório no Detran ou fazia convênio com os cartórios de nota. Isso foi feito com referendo do Ministério Público e da Justiça. Se eu precisava de mesa e cadeira para montar uma sala, mas não tinha recurso, mandava um pedido para os cartórios e eles faziam projeto, compravam o material e faziam a doação. No final de 2008 isso foi proibido e eu chamei o presidente dos cartórios e falei: “acabou o convênio”. Entraram na Justiça contra o meu ato e a Justiça me determinou que mantivesse o convênio. Fui condenado pois cumpri a ordem.

E o senhor ainda luta por isso?

A condenação foi feita e me foi imposta uma multa que não paguei, pois entrei com recurso. Eu não poderia exercer cargo público em cinco anos. Isso vence este ano.

Fonte: Jornal de Brasília

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