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Despesas acima do teto constitucional custaram pelo menos R$11,1 bi em 2023 à administração pública, aponta estudo do Movimento Pessoas à Frente

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  • Penduricalhos no poder público estão concentrados em carreiras específicas e precisam de solução a partir de dados e evidências;
  • Versão atual da Proposta de Emenda Constitucional 45/2024 (PEC 45), aprovada em votação nesta quinta-feira (19/12/2024), permite a manutenção penduricalhos atuais, que geram os supersalários, e permite ainda a criação de novos adicionais salariais por meio de lei ordinária, e não por lei complementar;
  • Estudo elaborado pelo pesquisador Bruno Carazza também aponta que apenas quatro das 32 exceções presentes no projeto de lei 2.721/21 podem aumentar o impacto em R$3,4 bi sobre o orçamento do Judiciário e do Ministério Público já em 2025;
  • Aprovação do PL pode gerar um efeito cascata de mais de R$26,7 bi ao Poder Executivo com apenas duas das exceções, um acréscimo de mais de 360%


Dezembro de 2024 – Uma pesquisa encomendada pelo Movimento Pessoas à Frente sobre o impacto dos chamados “supersalários” no serviço público federal identificou que as despesas acima do teto constitucional custaram mais de R$11,1 bilhões para os cofres da administração pública em 2023. A conta considerou somente o Judiciário (R$7,1 bilhões) e o Ministério Público (R$4 bilhões), onde os servidores têm salários mais altos. A pesquisa “Além do teto: análise e contribuições para o fim dos Supersalários” foi conduzida pelo pesquisador e professor da Fundação Dom Cabral, Bruno Carazza.

Nesta quinta-feira (19/12/2024), foi votada e aprovada a Proposta de Emenda Constitucional 45/2024 (PEC 45), cujo texto atual permite a manutenção dos penduricalhos atuais, como adicionais ao salário classificados em portarias e resoluções infralegais de maneira duvidosa como indenizatórios, como no caso de alguns bônus de desempenho, auxílios moradia, à saúde e outras verbas, que promovem ainda mais desigualdade dentro do serviço público. A PEC 45 ainda facilita a criação de novos adicionais por meio de lei ordinária, e não por lei complementar.

“O impacto dos penduricalhos vai além da moralidade, da eficiência e do bom uso dos recursos orçamentários da administração pública: é urgente construir uma política remuneratória condizente com um Estado preocupado em combater desigualdades e construir um ambiente institucional propício à efetivação da democracia”, diz Jessika Moreira, diretora executiva do Movimento Pessoas à Frente. “O Congresso precisa agir com responsabilidade e barrar a aprovação do texto atual sobre este tema na PEC 45 e de outros projetos que institucionalizam os supersalários, como o PL 2721/21”, complementa Moreira.

De acordo com dados públicos, 93% dos magistrados brasileiros receberam um valor superior ao teto no agregado no último ano, enquanto no Ministério Público esse índice é de 91,5%. Por outro lado, o número de servidores públicos de outros órgãos que superaram o teto no agregado, em 2023, é bastante inferior. Na Câmara dos Deputados, 0,7% dos profissionais receberam salários acima do teto institucional no ano passado. No Executivo Federal, incluindo civis e militares, esse número foi de 0,14%.

Outro resultado do estudo refere-se à falta de efetividade do chamado “abate-teto”, medida de controle econômico que tem como objetivo limitar o crescimento de determinados valores ou custos, evitando que ultrapassem um limite estabelecido. Tanto no Judiciário quanto no Ministério Público essa medida não funcionou, conforme mostram os gráficos abaixo:

Entre os principais gastos incorridos em 2023, a indenização de férias não gozadas para a magistratura custou R$1 bilhão aos cofres públicos, enquanto para o Ministério Público esse valor foi de R$464,2 milhões. Já as gratificações “por exercício cumulativo de ofícios” oneraram o Estado em R$788,9 milhões no Judiciário e R$508,7 milhões no MP, enquanto os pagamentos retroativos somaram R$2 bilhões e R$1,1 bilhão, respectivamente. Esse impacto ainda tem um valor subestimado, dado que muitos órgãos e carreiras não disponibilizam dados de qualidade sobre a remuneração de seus profissionais. Esse é o caso de órgãos de controle, por exemplo. Também não há padronização entre os dados remuneratórios, dificultando uma análise mais ampla.

PL 2.721/21 mantém privilégios com 32 exceções

Atualmente, há mais de uma iniciativa em andamento que trata dos “supersalários”  e que poderia mudar esse cenário, porém os textos apontam para outro caminho. Um dos principais e mais antigos, o PL 2.721/21, está atualmente em tramitação no Senado Federal. O estudo demonstra que esse PL não resolve o problema e pode prejudicar ainda mais os cofres públicos, pois institucionaliza 32 exceções ao teto. Considerando apenas quatro delas, pode aumentar o impacto orçamentário em R$3,4 bilhões no Judiciário e Ministério Público.

As quatro exceções avaliadas são: o pagamento em dobro do adicional de 1/3 de férias, dada a redação dúbia do inciso III do art. 2º do projeto; a gratificação por exercício cumulativo de ofícios; auxílio-alimentação; e o ressarcimento de despesas com plano de saúde (“auxílio-saúde”).

Os dados representam apenas uma pequena amostra do efeito total que a aprovação de um projeto supostamente concebido para corrigir distorções salariais pode trazer. O impacto seria muito maior caso houvesse acesso a informações mais detalhadas dessas rubricas, bem como se fosse possível ampliar a análise para outros órgãos.

Para Moreira, “diante de seus desafios sociais e econômicos, o Brasil não pode postergar o combate aos supersalários de uma minoria de servidores públicos. São privilégios incompatíveis com a oferta de serviços públicos de qualidade para toda a população. É essencial que se construa uma estrutura remuneratória condizente com um Estado preocupado em combater desigualdades, e isso começa pela própria política salarial do serviço público, além de uma conceituação clara em relação ao que é, de fato, indenizatório. As iniciativas que vemos atualmente não resolvem essa situação e podem, inclusive, legitimar e ampliar pagamentos extras ”.

Segundo o estudo, a aprovação do PL 2.721/21  também pode gerar um efeito cascata de mais de R$26,7 bilhões ao Poder Executivo, um crescimento de mais de 360%. Isso porque muitas verbas recebidas pelos funcionários do Executivo Federal têm valor bem menor do que o máximo estabelecido pelo projeto.

Recomendações do estudo

A pesquisa traz sugestões que poderiam nortear uma solução mais eficaz para a questão dos supersalários no funcionalismo público brasileiro.

Em primeiro lugar, como se trata de um problema concentrado em poucas carreiras – principalmente Magistratura e Ministério Público -, a regulamentação do teto e suas exceções deveria ser feita via emenda constitucional ou lei complementar, sob pena de tornarem-se inefetivas segundo o argumento de contrariarem o princípio da separação de Poderes ou, no caso de Estados e municípios, o pacto federativo.

O estudo também mostra que listar individualmente as exceções ao teto não é uma boa estratégia – a expansão exagerada das hipóteses de pagamentos pode acabar superando o valor dos subsídios dos ministros do STF. Ou seja, a redação da emenda constitucional ou da lei complementar deve abarcar os pagamentos de qualquer natureza sob o teto constitucional.

Outra medida urgente é definir com rigor a diferença entre verbas indenizatórias e remuneratórias, além de ajustar a legislação tributária para incluir esse tipo de pagamento nas hipóteses de incidência do imposto de renda de pessoa física.

Qualquer proposta que vise limitar os supersalários no funcionalismo público também deve limitar a discricionariedade com que órgãos dos Poderes Legislativo (inclusive Tribunais de Contas), Judiciário e Ministério Público, têm de criar administrativamente formas de remuneração para seus servidores e membros, incluindo pagamentos retroativos.

Por último, é fundamental o estabelecimento de um dispositivo que garanta, no prazo de um ano, que todos os órgãos de todos os Poderes e níveis federais instituam um sistema integrado de divulgação de dados relativos às remunerações de servidores ativos, inativos e pensionistas.

 

Sobre o Movimento Pessoas à Frente

O Movimento Pessoas à Frente é uma organização da sociedade civil, plural e suprapartidária, que elabora coletivamente diretrizes para uma gestão mais efetiva do Estado brasileiro. Com base em evidências, ajuda a construir e viabilizar propostas para aperfeiçoar políticas públicas de gestão de pessoas no setor público, com foco em lideranças. A rede de membros do Movimento Pessoas à Frente une especialistas, acadêmicos, parlamentares, integrantes dos poderes públicos federal e estadual, sindicatos e terceiro setor, que agregam à rede visões políticas, sociais e econômicas plurais.

https://movimentopessoasafrente.org.br/

 

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