Entre a poesia de Frei Betto e a política de Nicolás Maduro, um contraste entre dois decretos de Natal que revelam realidades muito diferentes.
Alguns anos atrás, tive o privilégio de conhecer o “Decreto de Natal” de Frei Betto, um dos textos mais lindos e profundos que já li. Esse decreto nos leva a pensar sobre o verdadeiro espírito do Natal, que vai além das festas e dos presentes, destacando os valores de justiça, paz e solidariedade. Depois de muitos anos, me deparei com um outro “decreto de Natal” — desta vez, vindo de Nicolás Maduro, presidente da Venezuela. Mas este novo decreto é bem diferente. Trata-se de uma antecipação do Natal para o mês de outubro, um movimento que levanta muitas questões sobre seus verdadeiros objetivos.
Maduro decidiu antecipar a celebração do Natal na Venezuela para outubro, justificando sua ação como uma tentativa de “trazer alegria ao povo” em meio a uma crise profunda. No entanto, essa antecipação parece menos um gesto de boa vontade e mais uma estratégia política para desviar a atenção das questões que afligem o país: a falta de transparência, as contínuas violações de direitos humanos e uma crise humanitária severa.
Maduro parece compreender que o Natal que a humanidade celebra, na sua verdadeira data, não poderia jamais se alinhar com a realidade de seu regime. A antecipação para outubro é, antes de tudo, uma ação carregada de simbolismo: representa um descompasso intencional com o resto do mundo, uma tentativa de moldar a narrativa de acordo com os interesses do poder. O “Natal de Maduro” não é uma celebração de paz, esperança e renovação, mas uma ferramenta de distração, usada para desviar a atenção dos problemas que assolam a Venezuela.
Ao decretar um “Natal” que não coincide com o resto do mundo, Maduro cria uma nova realidade, uma narrativa própria que se distancia completamente dos valores universais que o verdadeiro Natal carrega. Enquanto o mundo se prepara para celebrar um tempo de união, reflexão e solidariedade, a Venezuela, sob o comando de seu líder, é levada a celebrar um Natal ao avesso. Esse “Natal antecipado” é menos sobre o nascimento de Jesus e mais sobre a perpetuação de um regime autoritário que busca mascarar suas falhas com celebrações superficiais e fora de contexto.
Essa antecipação não é apenas uma mudança de data no calendário; é uma tentativa de redefinir o próprio significado do Natal. Ao mover a celebração para outubro, Maduro envia uma mensagem clara de ruptura com o que é celebrado mundialmente. Em vez de um período de introspecção e de reafirmação de valores de amor e compaixão, o “Natal de Maduro” é transformado em uma festa artificial, um espetáculo destinado a encobrir a dura realidade de um país onde a fome, a pobreza e o medo dominam o cotidiano.
Enquanto o verdadeiro Natal é um chamado à solidariedade e à paz, o “Natal de Maduro” se revela como um triste reflexo de um governo que prefere criar ilusões de felicidade em vez de enfrentar os problemas de frente. A antecipação para outubro, então, não é apenas um ato arbitrário, mas uma demonstração de como símbolos e tradições podem ser distorcidos para servir a agendas políticas. O “Natal de Maduro” não é sobre Jesus, sobre o espírito de bondade ou sobre a renovação espiritual; é um Natal do autoritarismo, do controle e da manipulação.
Frei Betto, em seus “Decretos de Natal”, capturou a essência do que esta data representa: um momento para refletir sobre a injustiça e buscar uma vida mais alinhada com os ensinamentos de amor e humildade de Cristo. Em contraste, o decreto de Maduro sobre o Natal é uma tentativa de manipular um símbolo sagrado para perpetuar um regime que desrespeita esses mesmos valores. É como se Maduro entendesse que não poderia comemorar o mesmo Natal que o mundo celebra porque o Natal dele, de seu regime, é outro — um Natal da opressão, da mentira institucionalizada e da falta de compaixão.