Estudo aponta que convívio com voluntários aumenta autoestima, reduz ansiedade e melhora o tratamento de crianças com câncer, autismo e outras condições de saúde
Brincar, ouvir, pintar ou estar presente. Gestos aparentemente simples podem ter um poder terapêutico capaz de transformar a dor em acolhimento. Pesquisa conduzida por estudantes de Medicina do Centro Universitário de Brasília (CEUB) revela que o convívio com voluntários em hospitais e instituições de saúde melhora o bem-estar emocional e a qualidade de vida de crianças com doenças crônicas, devolvendo o prazer de viver a infância. Entre as histórias mais tocantes, está a de uma menina em tratamento oncológico que, após uma atividade com voluntários, abraçou a própria carequinha pela primeira vez depois da quimioterapia, transformando o medo em um gesto de coragem e beleza.
O estudo, intitulado “Impacto do trabalho voluntário na qualidade de vida de crianças portadoras de doenças crônicas na perspectiva de seus responsáveis”, foi desenvolvido por Ana Victória Amaral e Larissa Maciel. As pesquisadoras entrevistaram responsáveis por crianças com câncer, deficiência auditiva e Transtorno do Espectro Autista (TEA) que participam de projetos de voluntariado em instituições do Distrito Federal. Os resultados apontam que o convívio com voluntários melhora o bem-estar emocional e físico, amplia a socialização e fortalece a autoestima de meninos e meninas que enfrentam longos períodos de tratamento.
De acordo com as autoras, as atividades lúdicas e artísticas promovidas pelos voluntários foram o principal fator das mudanças observadas. “O brincar foi entendido como uma ferramenta de resiliência e comunicação emocional, não mera recreação”, explicam Ana Victória e Larissa. Inspiradas no conceito de “espaço potencial”, do psicanalista Donald Winnicott, as pesquisadoras apontam que o ato de brincar cria um território simbólico onde a criança pode elaborar o sofrimento e reencontrar sua liberdade interior.
A pesquisa revela ainda que o impacto positivo do voluntariado vai além das crianças. Para muitas mães solo, que enfrentam sobrecarga emocional e financeira, a presença dos voluntários representa um respiro na rotina de cuidados. “As mães relatam que ver os filhos sorrindo pela primeira vez na semana, trocar experiências e sentir-se acolhidas por outras mulheres foi transformador”, relata Tania Inessa, professora de Psicologia e Medicina do CEUB e orientadora do estudo.
No estudo, as estudantes destacam que fé, esperança e resiliência são pilares que sustentam essas cuidadoras e que o voluntariado, ao criar laços e promover escuta ativa, reaviva o sentido de comunidade e solidariedade dentro dos hospitais. “O voluntariado nos faz voltar à essência da medicina: servir ao outro sem esperar nada em troca”, resumem as alunas.
Entre o amor e a política pública
Para a orientadora da pesquisa, Tania Inessa, o trabalho voluntário deve ser compreendido como parte integrante da rede de atenção à saúde, não apenas como um gesto de caridade. “O adoecimento é um fenômeno complexo, que envolve dimensões biológicas, sociais e emocionais. O voluntariado cria espaços de convivência e troca que fortalecem o cuidado integral”, explica. Ela ressalta que pesquisas como a do CEUB podem orientar políticas públicas voltadas à humanização hospitalar e à integração da área da saúde com o voluntariado.
Humanizar é também formar
Como próximos passos, as autoras pretendem ampliar o estudo e estimular parcerias entre universidades, hospitais e organizações sociais, expandindo o alcance das iniciativas dos trabalhos voluntários. “Quanto mais habilidades temos, mais podemos ajudar as pessoas. O voluntariado é uma filosofia de vida que humaniza a profissão e transforma quem serve e quem é servido”, concluem as futuras médicas.

